terça-feira, 20 de agosto de 2013

Uma antropóloga no UFC

Esse final de semana tive uma experiência antropológica daquelas. Estava iniciando uma pesquisa de mercado para uma marca que tem grande relevância no mundo UFC, o BonyAçaí, produto genuinamente brasileiro que dá “força aos super campeões” (Veja mais aqui) e o Bony, criador e proprietário da marca me disse categórico “pra você entender o meu produto, você precisa ir a uma luta”, fui.
Cheguei ao local com 3 horas de antecedência, e logo de cara encontrei uma longa fila de pessoas empolgadas, homens, mulheres, crianças, adolescentes eufóricos e empolgados. Vi muita animação e entusiasmo por lá, achei estranho pois meu conceito de fila é outro, lotado de desânimo, chateação e muitas reclamações. No entanto, percebi que a fila do UFC é diferente (possivelmente outras filas de grandes eventos também) pois era parte de um ritual de consumo. Na verdade a fila é o local da troca de informações, conhecimento, lugar da bebida descontraída, de conhecer novas pessoas, partilhar paixões, defender lutadores mais queridos, assim como demonstrar suas origens, estavam lá bandeiras do Pará, Acre, Amazonas, entre outros. A fila é de fato o consumo de ideias e reflexo de associativismo em prol de uma paixão.
Abriram os portões, gargalhadas, pressa, passos largos, tínhamos que encontrar bons lugares, algumas pessoas desconhecidas me deram dicas sobre as melhores cadeiras, posições e como proceder. Senti um altruísmo desinteressado procurando me orientar da melhor forma e ao mesmo tempo afirmando que eu iria adorar o evento podendo até me viciar, TEMI.
Encontramos nossos lugares, fui com o meu namorado, também antropólogo e trabalhava no na pesquisa, ele já era um entusiasta do UFC e do açaí, estava no melhor dos mundos, igual pinto na chuva. Além de nós, um amigo que adora experiências extracorpóreas, o que faz dele a companhia perfeita.
De todo modo interessante fazer algumas observações, o público é o mais democrático possível, gordos, marombados, magros-chassi-de-frango, mulheres, crianças, marias-tatames, coroas, e o que vocês imaginarem faziam parte do evento. Tudo junto e misturado.
Outro ponto é a própria ebulição de sentidos que um evento desse porte proporciona, música alta forte como rock ou rap faziam parte da trilha sonora, os jogos de luz com muitos efeitos nos entorpeciam com uma total sinestesia de sentidos. Passamos cerca de 10 horas em função de tudo que nos enchia os olhos.
Me vi completamente afetada pelo campo, eu que nunca liguei pra qualquer esporte muito menos os mais violentos, me vi gritando por sangue, por nocautes, por pressão. “Arrebenta com ele Lyoto!”
Sim, na verdade faz parte do fazer antropológico a observação participante, com olhar focalizado no que está acontecendo a sua volta e ao mesmo tempo desnaturalizando nossa própria reação em relação ao que estamos vivenciando. Eu ali era como uma consumidora qualquer, que diferente de outras pessoas faz um relatório sobre os impactos do que viveu e experenciou.
Os lutadores são uns caras gente boa, fortões de bom coração, uns vitoriosos que estão batalhando contra os desafios na vida e no octógono, são valorizados pelas suas trajetórias de vida, pelos seus valores morais e éticos, pela humildade sempre exaltada, e nisso o Anderson Silva errou feio, o problema não foi ele ter perdido, foi ele ter colocado um baita salto alto. O nocaute foi o castigo, disseram. Pois bem, agora ele vestiu a sandália da humildade e pode ser que a estrela volte a brilhar.
O que posso dizer é que participar de experiências como essa, quando posso exercitar o choque cultural me faz uma pesquisadora-antropóloga melhor e mais consciente, conhecer os valores, as emoções e partilhar desses sentimentos faz com que eu entenda todo o contexto desses consumidores, o que me ajuda a interpretar com qualidade o que vi, o que li, o que me contaram.
O UFC é de fato um evento que mexe com todos os nossos sentidos, assim como um grande culto de profissão de fé de qualquer religião que soma muitos indivíduos com um único objetivo. UFC conjuga notoriamente uma série de valores: Fé na força, fé na humildade, fé na vitória.