domingo, 4 de agosto de 2013

A UPP ME CALOU


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Caros leitores, para começar, peço desculpas pelo meu longo silêncio. O grande volume de trabalho me absorveu. Estava envolvida com muitas aulas, palestras  e pesquisas que comprometiam minha produção textual. Além disso, após a pacificação da favela me mantive fora de lá por razões metodológicas.
Estava tudo muito tenso. Um burburinho começou a ecoar pela favela dizendo que a localidade vizinha seria pacificada, “tinha muito olheiro da civil por lá”, me disseram. Lá são “os alemão” , área igualmente pobre com todas as carências características de favelas, mas era dominada por uma facção arqui-rival do comando da “nossa” área. Interessante perceber que mesmo os moradores, que não tem qualquer relação com o tráfico e os negócios que os “meninos” comandam, introjetam em seu ethos o pertencimento, tal como time o futebol para o qual torcem.
Os “alemão”, por assim dizer, são os “meninos” do outro lado da Avenida Brasil - que não valem nada, são violentos e matam mesmo. Os daqui são “os meninos” que “a gente viu crescer”, que “às vezes pegam pesado” (assumem), mas na maior parte do tempo até agem em consonância com os valores morais e simbólicos adotadas na favela, compreendem as necessidades locais e, sabendo leva-los no papo e não causando problemas, são tranquilos e “não mexem com a gente”.
O que pude perceber antes do burburinho da “pacificação” é que os moradores estavam divididos. Havia aqueles que estavam eufóricos e costumavam não assumir esse estado em público, e tinha aqueles que não eram a favor e temiam o desconhecido: uma situação com a qual não sabiam como lidar, pois, segundo eles, seriam dois poderes mandando nos moradores e na associação. “A gente não vai saber a quem obedecer, ou vai ter que obedecer os dois, os meninos e os polícia!”, contou uma moradora.
Passou a confusão da “limpeza” da CORE e da PM. O BOPE se instalou para “dar ordenamento” e “recuperar o território” para então “devolver a favela para os moradores”. Hoje não se sabe quem é quem, quem recebe arrego e quem é correto. Os “meninos” estão lá, não se sabe aonde, nem quando, mas todos temem uma represália. Uma nova ordem foi instaurada. A lei do silêncio impera e novas moralidades são impostas. Todos ficam por um longo tempo sem saber direito como proceder e tudo tem que ser feito apenas depois da consulta à liderança oficial local: os “polícia”.
Saí da favela para esperar a poeira assentar. Estou fora de lá há cerca de 7 meses. Volto em agosto. Saída estratégica para garantir segurança e rigor metodológico, pois os interlocutores, os moradores, amigos e vizinhos que tive e estabeleci estavam tensos. Minhas perguntas e presença poderiam ser mais um problema pra eles. Por respeito, me retirei.
Nos próximos posts escreverei sobre o processo de pacificação e algumas impressões que fui elaborando ao longo desses meses.  Até lá!



Texto originalmente publicado no blog Diários das classes C, D e E no site Mundo do Marketing
http://www.mundodomarketing.com.br/blogs/diario-das-classes-c-d-e-e