sexta-feira, 16 de março de 2012

Usos e contra-usos da tecnologia

Pra quem já leu meus artigos ou assistiu minhas palestras sabe que partilho com Bruno Latour que determinados bens são produtos sociotécnicos, ou seja, estão em constante contato e sintonia, o aparelho (bem) e a sociedade (o usuário). Partilhando também da ideia de que o consumidor não é um ser passivo, aquele que apenas usa o bem, mas sim é ativo, ele experimenta, manipula, customiza, recria, interage com esse bem, De Certeau prefere chamar esse consumidor de usuário por acreditar que o termo consumidor denote uma posição passiva.

Assim como o furto e fraude de energia elétrica é uma manipulação de um bem ou serviço, ou a caneta bic criada para escrever, pode usada com outros fins, desde prendedor de cabelo a uma arma dentro de um presídio (entre outras tantas). Uma notícia essa semana me chamou atenção.

Um aparelho denominado "capetinha" bloqueia o rastreamento de caminhões de carga facilitando o roubo e estravio de mercadorias por ladrões nas estradas brasileiras. Mais uma vez, diante de uma tecnologia desenvolvida para segurança, uma estratégia empresarial de segurança é quebrada por outra tecnologia produzida na surdina, uma tática para contrapor a ordem, o uso, ou seja, o contra-uso, neste caso, o roubo.

Veja a matéria logo abaixo:



Ladrões usavam bloqueador de rastreador para roubar caminhões

Aparelho usado pelo grupo bloqueava sinais de rastreadores e celulares, num raio de até um quilômetro. Nove homens foram presos.

A Polícia Federal prendeu nove homens que usavam um bloqueador de rastreador por satélite para roubar caminhões, em São Paulo.
O aparelho, cheio de antenas, apelidado no Brasil de "capeta" ou "capetinha" é pequeno, mas causa estragos no transporte de cargas pelo país.
Durante a ação, os ladrões pegam a estrada e ligam o equipamento, que cria um campo de isolamento e bloqueia os sinais de rastreadores e celulares, num raio de até um quilômetro. Um caminho aberto para roubo de caminhões.
Primeiro, de outro veículo, um dos criminosos avisa o caminhoneiro sobre um falso defeito, como pneu furado ou vazamento de óleo. O motorista, ao parar no acostamento, é dominado.
No último roubo o caminhão não saiu da estrada. Foi levado de Guarulhos para Caçapava. O motorista ficou em cativeiro por duas horas até o momento da prisão da quadrilha.
O caminhão que tinha partido do Espírito Santo faria entregas na Grande São Paulo. Depois do roubo, para não correr risco, os ladrões ligaram o 'capeta' a uma bateria no banco do passageiro e destruíram o painel a procura do rastreador. Quando chegaram num posto de combustível, em Caçapava, a polícia, que já acompanhava os passos da quadrilha, estava lá.
“Nesse local houve um encontro entre o grupo criminoso que efetivamente roubou o veículo e a célula formada pelos receptadores que iriam recebê-lo, foi então o momento que foi possível realizar a abordagem e prender os dois grupos ao mesmo tempo”, diz o delegado da Polícia Federal, Guilherme de Castro Almeida.
A quadrilha atuava na via Dutra e na Fernão Dias que fazem a ligação entre São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Segundo a Polícia Federal, roubou um caminhão por dia, nos últimos três meses.

Fonte: http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2012/03/ladroes-usavam-bloqueador-de-rastreador-para-roubar-caminhoes.html


Até quando executivos das mais variadas áreas verão que não adianta contrapor a ordem ou desordem através da tecnologia? O usuário manipula o sistema e cria pra si uma outra ordem, uma outra tecnologia para combater a estratégia e chegar ao seu objetivo. A questão é estrutural e não tecnológica.